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Dom Salvador E Abolição - 'Som, Sangue E Raça - 1971


Talvez, essa seja a obra mais difícil e emblemática da qual, até agora, me arrisquei a tecer comentários, desde a concepção desse site.

A obra é essa atmosfera experimental, cheia de elementos que tornariam impossível adequar este álbum dentro de um ou outro gênero musical específico, até mesmo pelas caracteísticas pecualiares a cada um dos músicos envolvidos.

O saxofonista Oberdam Magalhães, que posteriormente foi o responsável por um dos grupos mais incríveis que a MPB já teve o prazer de chamar de "sua", (Banda Black Rio) assim como também o baterista Rubem; tinham uma pegada Soul, funk, R&B; Imagine isso unido ao idealizador dessa obra, Dom Salvador, que é um pianista de mão cheia e parte intergrante da escola da Bossa Nova e do Samba Jazz. Só por aí já da para notar que misturas inusitadas rolam nessa obra, isso sem detalhar as influências e abordagens dos demais músicos que aceitaram entrar nessa vibe e nos presentear com essa maravilha sonora.

É o início do movimento "Black Rio", que mais do que o nome da famosa banda já citada, era o início de um grupo, formado por uma galera sempre antenada ao que rolava lá fora (como a guerra do vietnã, o movimento dos Panteras Negras...), mas que eram armados apenas com seus instrumentos musicais e ideias, nos encontros promovidos nos bairros do suburbio do Rio de Janeiro. Todos devidamente caracterizados, seus cabelos black power, suas potentes vozes que alertavam o povo da periferia para o que de fato se vivia lá fora e aqui (durante os anos de chumbo), tanto que um dos ícones do movimento, Gerson King Combo, teve um show interrompido com tamanha truculência acabando com um baile que rolava na sede da escola de samba Portela. Mas qual seria o motivo? Ora! Os milicos, como de costume ardilosos, não eram bobos. Viam que as vozes que os incomodam eram as dos intelectuais, dos poucos intelectuais, mas imagine se um grupo de músicos começa a conscientizar os menos favorecidos (entenda como favelados e em especial negros) de que tudo estava errado e que o ideal seria descer e mostrar que "o morro tem vez SIM"? Desculpe o termo grosseriro, mas "quem tem cu, tem medo" e os milicos tinham CU, só fingiam não ter... Eles não queriam ver a favela politizada e fizeram de tudo para minar os movimentos culturais negros.

Bem! Deixando um pouco a importante história de lado e falando do álbum, se ouve de tudo! Ritmos nordestinos, psicodelia, soul, funk, samba jazz.... E o mix ficou irado!

A primeira faixa já começa com um discurso digno de Martin Luther King e Fred Hampton (que na minha opinião foi o líder mais consciente do movimento "Panteras Negras"), ambos assassinados por pregar o amor e a luta, por não permitir que o povo deixasse de enxergar a oportunidade de dias melhores. A música segue essa linha, falando de amor, alegria e só por aí já mostra a que o grupo veio...

Daí pra frente é viajar no som dos caras! "Hei Você" tem uma pegada mais regional e uma letra bem dentro dos ideais já citados:

Eu não nasci na nobreza por isso a pobreza não devo temer Mas vou mudar o meu rumo assim me acostumo a sorrir se perder (Trecho da canção "Hei Você")

O álbum conta com muitos temas instrumentais, todos lindos e de extremo bom gosto e versatilidade, dentre eles "Rio" e "Tio Macro" que é um samba funk de primeiríssima linha, um zilhão de variações rítimicas, conduzidas pelo piano de Dom Salvador, daquelas de fundir a cuca e se perguntar:

- Como os caras pensaram isso? Como rolou esse som louco mas altamente dançante e imprevísivel.?

Conforme já dito! Este álbum é mais do que um LP, mas sim o início de um movimento, infelizmente reprimido pela covardia daqueles que se mantinham no poder a custo da ostentação de armas, torturas e mortes; aqueles que talvez por notar que apenas o poder bélico os mantinha à frente de uma pátria e nada mais, pois pensar. não era o forte deles, todo aquele que esboçou ter essa capacidade, foi tratado com truculência.

Concluo a postagem com um trecho da canção "Evo":

"Você precisa saber do amor Que não tem cor Ele habita em seu ser sem dor Seu Criador..." (Trecho da canção: Evo"

Que mais uma vez fala do amor, mesmo em meio a um período de tanto ódio, mas que bom, ainda haviam aqueles que acreditavam em um futuro melhor...

Faixas:

1 - Uma Vida -- Dom Salvador E Abolição -- (Arnoldo Medeiros & Dom Salvador) 2 - Guanabara -- Dom Salvador E Abolição -- (Arnoldo Medeiros & Dom Salvador) 3 - Hei! Você -- Dom Salvador E Abolição -- (Getúlio Cortes & Nelsinho) 4 - Som, Sangue E Raça -- Dom Salvador E Abolição -- (Marco Versiani & Dom Salvador) 5 - Tema Pro Gaguinho -- Dom Salvador E Abolição -- (Dom Salvador) 6 - O Rio -- Dom Salvador E Abolição -- (Arnoldo Medeiros & Dom Salvador) 7 - Evo -- Dom Salvador E Abolição -- (Pedro Santos & Dom Salvador) 8 - Number One -- Dom Salvador E Abolição -- (Dom Salvador) 9 - Folia De Reis -- Dom Salvador E Abolição -- (Paulo Silva & Jorge Canseira) 10 - Moeda, Reza E Cor -- Dom Salvador E Abolição -- (Marcos Versiani & Dom Salvador) 11 - Samba Do Malandrinho -- Dom Salvador E Abolição -- (Dom Salvador) 12 - Tio Macrô -- Dom Salvador E Abolição -- (Arnoldo Medeiros & Dom Salvador) Músicos: Piano: Dom Salvador Saxofone e flauta: Oberdan Magalhães Guitarra: José Carlos Vocal: Getúlio Cortês Baixo: Rubão Sabino Bateria e vocais: Luiz Carlos Santos Trompete e flugelhorn: Darcy Vocal: Mariá Percussão e vocal: Nelsinho Trombone: Serginho


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