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Alexander Gordin - Lanny Gordin

Multi-instrumentista, compositor

Assumo não ser dono de boa memória, minha memória é seletiva e se restringe a funcionar bem para determinados temas, em especial ligados à minha linha de interesses, como a música e o cinema; por exemplo, mas me lembro bem da primeira vez que ouvi o som da guitarra de Lanny Gordin.

 

Era um vinil de Caetano Veloso, em que ainda muito jovem ouvi a gravação original de "Atrás do Trio Elétrico" e já tinha certo interesse pelo mundo musical, pirei! Eu que cresci em um ambiente musical muito voltado para o samba, soul; estava ouvindo uma distorção violenta e uma abordagem 100% diferente de tudo que até então já havia escutado. Muitos e muitos anos se passaram. Aquela minha pré-disposição à música se fez real, seja como instrumentista, pesquisador... E assumo que mesmo depois de ouvir mais de uma centena de milhares de canções (me arrisco a dizer que já cheguei a esses números) sigo ouvindo o som da guitarra de Lanny como único.

 

Essas palavras são minhas, o mero idealizador desse projeto "Vire o Vinil", mas Lanny é aclamado por grandes nomes como Pepeu Gomes, Sérgio Dias (Os Mutantes), Roberto Frejat, Edgard Scandurra (Ira), Luiz Carlini (Tutti-Frutti & Rita Lee), Jards Macalé; dentre tantos e tantos outros, alçando Lanny ao status de uma espécie de "Deus da Guitarra" brasileiro.

 

Lanny é responsável por muitas das pérolas gravadas no início da carreira de gente como Gilberto Gil ("Cérebro Eletrônico", "2001"...), Caetano Veloso ("Atrás do Trio Elétrico", "Irene", "Não Identificado", "De Cara/Quero essa Mulher Assim mesmo"...), Gal Costa ("Dê um Rolê", "Vapor Barato", "Como 2 e 2", "Eu sou Terrível"...); álbuns como "Build Up (último álbum de Rita Lee com "Os Mutantes") a obra-prima "Mudei de Ideia - Antonio Carlos & Jocafi" (álbum já publicado neste site); dentre tantas outras gravações. Sabe o que isso quer dizer? Que certamente você já ouviu o som de Lanny e sequer sabia. Caso ainda assim não tenha escutado nada, corre; a obra do cara está aí para isso...

 

É uma honra imensa trazer à vocês um pouco da história desse grande nome da nossa música.

 

 

Vire o Vinil - Para a curiosidade de muitos, você é nascido na China, filho de pai russo e mãe polonesa. A que se deu a escolha de seus pais em optar pelo Brasil para fixar moradia?

 

Lanny Gordin - Meu pai ouviu falar que o Brasil era um paraíso e a vida aqui era muito boa.

 

VoV - Me arisco a dizer, com bases em relatos de grandes artistas que se renderam e ainda hoje se rendem ao seu talento, que você realmente foi o "inventor" da guitarra elétrica no Brasil. Uma abordagem única e que ao menos eu, consigo de imediato identificar quando se trata ou não de uma gravação sua. Como foi o início de sua vida músical?

 

Lanny Gordin - Eu comecei a minha vida musical aprendendo piano com a minha avó, que como meu pai era pianista. Eu nunca me interessei pelo piano, mas um dia eu ouvi o som de uma guitarra e pedi  para o meu pai me comprar esse instrumento, ele me disse que se estudasse violão ele me compraria uma guitarra e assim foi feito.

 

VoV - Antes da sua fase "Tropicália", você chegou a gravar com alguns nomes da "Jovem Guarda". Sejamos francos! Sem menosprezar essa galera boa, mas a iniciativa da galera tropicalista, até por conta do tom de protesto, afronta; era abraçar a guitarra elétrica com unhas e dentes e seu estilo caiu como uma luva. Nesse tempo você já tinha em mente esse modo vigoroso de tocar e pesou menos a mão ou com o tempo o "Lanny tropicalista" nasceu?

 

Lanny Gordin - Na verdade, nessa época eu gravei com a Silvinha e o Eduardo Araújo. Com a Wanderléia eu fiz apenas um show aos 15 anos. e gravei com o Erasmo muito tempo depois.

 

Quando eu comecei a acompanhar o Gil, o Caetano e a Gal o  meu som se encaixou perfeitamente com o som deles.

 

Eu já fazia esse som na boate Stardust(que pertencia ao pai de Lanny) com o Hermeto (Pascoal) nos ensaios, quando meu pai não estava vendo, pois ele queria um som comercial para que os frequentadores pudessem dançar.

Quando ele saia para a cozinha, a gente “quebrava tudo” e como o Hermeto não enxerga bem, eu ficava de prontidão e quando via que ele estava voltando eu avisava o Hermeto e a gente "maneirava" o som e voltava a tocar bonitinho.

 

VoV - Falando um pouco do projeto "Brazilian Octopus", que dentre outros contou com a presença de Hermeto Pascoal,  O único álbum lançado pelo grupo, mostra ainda mais o quão versátil músico você é. Como foi entrar nessa onda bem diferente, onde ainda se via pouco do vigor e distorções; que fazem parte do seu conhecido estilo? O álbum tinha muito mais a cara de o  "Quarteto Novo" (grupo instrumental do qual Hermeto fez parte e o único álbum lançado, já foi publicado nesse site)

 

Lanny Gordin - Eu fui chamado pela Rhodia, uma empresa de moda dos anos 60 para acompanhar os desfiles que ela promovia com o Brazilian Octopus. O Hermeto teve a idéia de fazer um disco que era para o desfile.

 

VoV - Ainda sobre o octeto. É verdade que o projeto só não seguiu adiante pelo fato de os responsáveis não terem "arcado devidamente" seus compromissos financeiros que tinha com o grupo?

 

Lanny Gordin - Eu nunca soube nada disso e os desfiles acabaram e esse projeto se encerrou por isso.

 

VoV - Como conheceu Rogério Duprat e qual a importância do maestro em sua carreira?

 

Lanny Gordin - Eu conheci o Rogério Duprat quando gravei o primeiro disco da Gal . Ele me inspirou para ser um bom músico. Ele me deixava completamente à vontade dentro do estúdio e deu tudo certo.

 

VoV - Como se deu o encontro com a galera da Tropicália e pintou essa parceria que só fez bem à nossa música, obra do Duprat?

 

Lanny Gordin - Eu encontrei primeiramente com o Gilberto Gil, que me foi apresentado pelo Toni Osanah, e ele me convidou para tocar com ele depois de ouvir meu som. A partir daí fui sendo apresentado para a Gal e Caetano que me convidaram para tocar com eles.

 

VoV- Em uma fase em que a ala dos "puristas" abominavam o uso da guitarra elétrica, viram um cabeludo, nascido na China, empunhando sua guitarra e fazendo todo aquele som. Como foi lidar com esse povo?

 

Lanny Gordin - Eu só me preocupava em tocar e tocava na boate então isso não chegou a mim. Quando comecei a tocar fora da boate esse fato já havia sido superado. As pessoas não sabiam que eu havia nascido na China e como sou de família russa não tenho traços físicos chineses.

 

VoV - Quais equipamentos utilizava na época? Esse timbre altamente psicodélico, que caiu nas graças dos grandes nomes da MPB, foi influência de que guitarristas e grupos?

 

Lanny Gordin - Eu utilizava um amplificador Giannini "tremendão", uma guitarra Giannini Supersonic e um pedal "Alan Warner"(fabricante), depois substituí pelo pedal que o Cláudio César Baptista (irmão de Arnaldo e Sérgio de "Os Mutantes"), fez especialmente para mim de presente.

Eu tive influências do Jimi Hendrix.

 

VoV - Em depoimento de Rogério Duprat, para o documentário "A História do Rock no Brasil", foi dito que vocês recebiam apenas a base, normalmente só as vozes, e você tinha total e plena libedade de criar. Como se dava esse processo de criação? Algo extremamente intuitivo ou estudava bem as canções e assim surgia as maravilhas que gravou?

 

Lanny Gordin - Meu processo de trabalho continua sendo o mesmo até hoje. Eu ouvia algumas vezes (duas ou três, mais ou menos) e depois saio tocando. Meu trabalho é totalmente intuitivo, toco de ouvido e não leio partituras, só cifras. Eu decorava a música e já tinha em mente o que iria tocar.

 

VoV - Quando se fala em Tropicália é impossível não associar a regime militar, exílio por parte de muitos músicos. Você chegou a sofrer perseguições nessa época?

 

Lanny Gordin - Não! Nunca sofri nenhum tipo de perseguição. Eu não entendo de política e sempre pensei em fazer e fiz apenas música.

 

VoV - Saíndo um pouco da ala dos tropicalista, que rendeu pérolas como o "Disco Branco" e o ultra experimental "Araça Azul" de Caetano Veloso, alguns com Gal Costa e outros com Gilberto Gil; você participou da gravação do álbum "Build Up", que é de Rita Lee, porém ainda tido como um trabalho de "Os Mutantes". Podemos dizer assim que você também teve sua fase "Mutante", mesmo que não reconhecido oficialmente?

 

Lanny Gordin - Eu fui convidado pela Rita para fazer algumas faixas desse disco. Eu apenas toquei o que ela me pediu e como fui músico de estúdio por muito tempo fiz meu som dentro do contexto, do som enfim, da unidade do disco.

 

VoV - "Jards Macalé" é um discaço (já publicado no site), um dos maiores da história da nossa música. Nesse álbum você mostrou ser também um exímio baixista. Como rolou isso? Optaram mesmo por não escolher um baixista de ofício ou você acabou abraçando a causa e tirando aquele som maravilhoso?

 

Lanny Gordin - Eu toco guitarra, violão e baixo desde a boate do meu pai. Eu trabalhei um ano como baixista com uma incrível cantora, instrumentista, compositora e musicista Ana Mazzoti. Eu gravei baixo também para a Gal no disco "Tuareg". Eu sou guitarrista, baixista e violonista.

 

VoV - Há pouco tempo conversei com Antônio Carlos (dupla de Jocafi), que associou a você grande parte dos méritos do primeiro álbum da dupla. Aquele som ainda soa hoje como muito original, tanto que Marcelo D2 usou a faixa "Kabaluerê" como música incindental em sua canção de maior sucesso. Como foi o processo de gravação?

 

Lanny Gordin - Bem, eu cheguei na gravadora RCA ensaiei com eles e gravei o disco como é o meu processo de trabalho.

 

VoV - Verdade que você tinha o hábito de tocar com a guitarra desafinada, ou podemos chamar isso de uma afinação alternativa e personalizada para Lanny Gordin?

 

Lanny Gordin - Era uma afinação alternativa e personalizada que eu criei para testar um novo som, diferente. E deu certo, pois fui muito elogiado pois eles acharam ousado.

 

VoV - Após ser extremamente disputado no mercado fonográfico, houve um longo período onde se manteve afastado dos palcos, mesmo tendo feito algumas poucas aparições, como nos discos de Itamar Assumpção e Chico César, mas ainda assim se mateve fora da mídia.

A fama chegou ao ponto em que você sentiu a necessidade desse distanciamento? Se importa em falar dessse tema?

 

Lanny Gordin - Após uma ‘bad trip’ meu pai me levou de volta para a boate, onde continuei trabalhando. Saí da mídia, mas continuei sendo chamado para gravações. Além destes que você citou, fiz disco e show com o Aguilar e a banda performática, entre outros. Existe uma lenda que eu parei de trabalhar, mas eu nunca parei pois nunca consegui ficar longe da música e da guitarra que são vitais para mim.

 

VoV - Pode nos contar um pouco sobre o "Projeto Alfa"?

 

Lanny Gordin - Eu conheci os meninos do ‘Projeto Alfa’ antes do ano 2000 e resolvemos formar uma banda dada a nossa afinidade musical. Desse nosso encontro fizemos dois cds com músicas minhas e em parceria com o Guilherme e com a banda, músicas que nasceram dentro do estúdio na hora em que gravávamos.

Fizemos vários shows em São Paulo capital e interior,  em outros estados e no exterior.

 

VoV - Para a alegria dos amantes da boa música, eis que com o passar do tempo você foi voltando aos palcos, gravou três discos, voltou aos shows, e segundo li, segue super afiado; ou seja! Em momento algum creio que tenha parado de estudar. Quais são os próximos projetos? Soube que há um filme em fase de finalização. Pode nos falar um pouco sobre?

 

Lanny Gordin - Como falei anteriormente, eu nunca parei de trabalhar, tocar e estudar apesar de ter ficado fora da mídia. Em 2000, fiz meu primeiro cd com músicas autorais minhas, graças ao meu querido amigo Luiz Calanca da "Baratos Afins".

 

A partir daí, já com o Projeto Alfa, resolvi lançar meu trabalho como artista e gravei mais dois discos com eles. Em 2006, gravei o cd "Duos" e tenho um inédito chamado "Lanny’s Quartet" sem previsão de lançamento. Atualmente estou com um show "Lanny Gordin" com três guitarras e repertório meu e de músicas da Tropicália.

 

Quanto ao filme, essa idéia começou em 2012, quando conheci o diretor do filme Gregório Gananian, essa idéia foi amadurecendo e finalmente conseguimos realizar no ano passado. Fomos gravar na China, em Xangai, cidade onde nasci, filmamos também em São Paulo e no Guarujá.

O filme se chama "Inaudito". O filme é um documentário nada convencional e não cronológico e fala sobre meu som, minha música, como diz o Greg: "é uma odisséia psicodélica".

 

Já filmamos e agora está em fase final de montagem e deverá ser lançado no meio do ano.

 

VoV - Que equipamentos usa hoje? Mantém o bom e velho fuzz ou hoje o som é outro?

 

Lanny Gordin - Hoje eu uso uma guitarra semi acústica quase sempre limpa mas, algumas vezes, uso um pedal de distorção.

 

VoV - Lanny. Só tenho a agradecer pela atenção, por ter participado desse projeto que visa mostrar o que a nossa música tem de melhor e sem dúvidas, isso inclui você. Quer deixar alguma mensagem? Agenda? Telefones para contato...

 

Lanny Gordin - Obrigado, querido! Deixo o meu contato nas minhas três páginas do Face, Lanny Gordin, Lanny Gordin II e minha fanpage.

 

Como mensagem, gostaria de falar que "temos a eternidade pela frente!"

 

 

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