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Miguel de Deus - Black Soul Brothers - 1977


Sempre que se fala sobre o cenário Soul/Funk setentista brasileiro, nomes como Tim Maia, Cassiano, Carlos Dafé, Tony Tornado, Gerson King Combo e Hyldon; São os primeiros, que em sua maioria das vezes, vem à mente. Justo? Sim! Sem dúvidas! Mas injusto é não citar a abordagem totalmente diferente e que inclui outros elementos, dentro dos gêneros citados, utilizadas por Miguel de Deus, neste álbum que foi sua única obra solo lançada, mas que em pouco mais de trinta e dois minutos, mostrou o quão diferenciado e injustiçado, foi esse grande artista.

O Baiano Miguel, já havia feito parte de dois grupos, antes de se lançar como artista solo. Foi um dos guitarristas de "Os Brasões" (que chegou a servir como banda de apoio para gente como Tom Zé e Gal Costa) e posteriormente fundou o grupo "Assim Assado", totalmente influenciado pelo estrondoso sucesso, feito na época, pelos "Secos e Molhados"; onde Miguel fez questão de imprimir até mesmo o visual cheio de plumas e paetês, que era característica do grupo de Ney Matogrosso, João Ricardo e Gerson Conrad.

Se MIguel tivesse parado por aí, realmente teria sido apenas mais um músico normal e em busca de mídia grana e sucesso; mas eis que no ano de 1977, toda loucura, genialidade e musicalidade; transbordaram em "Black Soul Brothers.

Não da para classificar apenas o álbum como sendo de funk ou soul, já que Miguel foi além, explorando o submundo de cada um dos gêneros citados.

Em uma mistura de "Nu-Funk" (também conhecido como "Gheto funk" e fez sucesso nas vozes de gente como o mestre Isaac Hayes, em especial em "Theme From Shatf", canção produzida para ser o tema, no cinema, do personagem Shaft, que é um dos grandes clássicos do cinema Blaxploitation; assim como certa fase de James Brown e Curtys Mayfield; dentre outros), elementos do "Soul Psicodélico (que é uma mistura de rock psicodélico com soul music) tendo uma atmosfera altamente viajandona, sucesso com grupos como o aclamado "Sly & the Family Stones) e o "Deep Soul" (que da todo um peso à soul music, misturando corais como os das igrejas norte-americanas, mais peso nos instrumentos, em especial nas linhas de baixo, fazendo da música ainda mais agitada e de uma energia louca); Só por aí já da para ver que o Homem era diferente.

Nas canções de Miguel, se destaca os instrumentais, o coro que normalmente é quem canta trechos que se repetem, enquanto o dono do swingue parece mais "pregar" (isso mesmo! Assim como nas igrejas), soltando gritos loucos, frases totalmente fora do que é cantado pelo coro, como se enfatizasse a necessidade de entrar naquela vibe, ministrando momentos em que sinceramente, a idéia que se tem é de que ao entrar no estúdio, ele se deixou levar pelo momento e simplesmente soltou tudo que havia de mais insano e genial, antes guardado.

O álbum começa com a canção "Cinco Anos", que é uma pedrada. Metais em brasa, um baixo frenético e um instrumental que faz a cama para as poucas frases:

"Fazem cinco anos que você saiu de casa

Eu não sei, se você está vivo

Fazem cinco anos que você saiu de casa,

Eu não sei, se você está morto..."

Que é curta e objetiva e soa como uma crítica ao período em que se vivia, anos de chumbo. Quantos saíram e não voltaram? Agora imagine essa crítica em uma atmosfera, psicodélica, de berros e puro swingue... Sonzeira!!!

A segunda canção é "Pedaços" em que mais uma vez, a exemplo de todo o álbum, tem um instrumental impecável e uma letra que fala de respirar a calma, afeto, abrir os sentidos... Um tanto quanto surrealista, deixando a interpretação livre, ouça e tire as suas.

Destaque também para a canção "Flaca Louca", que a julgar pelo contexto da letra debochada e as risadas de fundo, não era bem de "flaca" que ele queria chamar a moça em questão. Rende umas boas risadas pela loucura e irreverência.

A música que da nome ao álbum, começa com uma levada que lembra o "Santa Esmeralda" (grupo francês/americano, que foi sucesso na era da disco music, usando e abusando de levadas flamencas), antes de entrar na levada funk, mas mantendo esse flerte entre os genêros.

Dentre todas as faixas, que merecem ser escutadas com atenção, dou último destaque para a ambígua "Pode se queimar", acho que ficou meio "auto-explicativa", mas é uma sonzeira só...

Como já dito! Uma injustiça tamanha esse álbum não figurar dentre os grandes no que diz respeito a soul/funk music.

Miguel de Deus caiu no ostracismo e viveu seus últimos anos de pequenos shows, até sua morte no ano de 2007, na cidade de Campinas, interior de São Paulo. No mesmo ano, de sua morte, foi produzido o documentário "Black Soul Brother", que conta toda a história da vida do artista. Tem pela web, basta paciência para achar, mas vale a pena ver e saber um pouco mais..

Se for baixar o álbum, afaste tudo e não se importe se no outro dia os vizinhos imaginarem que você pirou, primeiro que não da para ouvir em volume baixo, segundo que eu duvido que em determinado momento, você não se solte e se pegue cantando, ou berrando, com Miguel de Deus.

Músicas:

01 – Cinco Anos (Miguel de Deus) 02 – Pedaços (Miguel de Deus) 03 – Mister Funk (Miguel de Deus / Nelsão Triunfo) 04 – Flaca Louca (Miguel de Deus) 05 – Black Soul Brothers (P. Rocco / Santiago) 06 – Lua Cheia (Miguel de Deus) 07 – Pode Se Queimar (Miguel de Deus) 08 – Fábrica de Papéis (Miguel de Deus)


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