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Rodger e Teti - Chão Sagrado - 1974


Ah, o nordeste! Nada contra quem conheça Paris, Londres ou Miami; Mas acho que antes de pensar em sair do Brasil, exaltar tudo de "divino e maravilhoso" que se vê lá fora, conhecer o nordeste é necessário.

Imagine um ano letivo de um ensino fundamental, sem que se tenha na grade matérias como português ou matemática. Não tirando o valor das demais matérias, em especial história que posso dizer é um dos pilares desse modesto site; mas não aprender a contar ou a escrever? Inadimissível! Traço esse comparativo em ser brasileiro, ter condições de viajar e não respirar o ar do nordeste, não sentir o ar, em especial do sertão, não ouvir aquele sotaque característico e encantador, não se emocionar com o sorriso daquela gente, em especial daqueles que vivem em cidades mais distantes, de pés no chão e que ainda hoje carregam água na cabeça.

Tenho em mim uma antiga e pulsante veia roqueira, cresci ouvindo Genesis, Rush e Pink Floyd; sou um fã INCONDICIONAL, em especial, da música negra norte-americana oriunda da Filadélfia e das maravilhas produzidas pela "MFSB" e pela "Salsoul Orchestra"; mas... A cultura nordestina é riquíssima e deve ser conhecida e partilhada. O nordeste foi responsável por "N" movimentos culturais, em especial no que diz respeito à poesia e música.

Este álbum é uma prova da versatilidade nordestina. Do quanto se é possível ser extremamente regional, mas ao mesmo tempo flertar com outras vertentes e extrair sonoridades lindas e que mostram um pouco "do que o nordeste tem".

Logo na capa do álbum, abaixo do nome dos artistas, está escrito "do pessoal do Ceará".

Está citação não é a toa, pois se trata de um "coletivo" de artistas que aos poucos foram migrando em direção ao sudeste, com um violão nas costas ou um bloco de notas, para tentar a sorte por meio da música e da literatura. Fazem parte desse grupo (tendo sido os primeiros a chegar) Fagner e Belchior, seguido por Ednardo e depois o casal Rodger e Teti; seguidos futuramete por tantos outros.

O álbum é muito bem produzido e como já dito, é de uma variedade impressionante de sonoridades, mas todas com aquele doce toque nordestino.

A faixa inicial "Bye-Bye Baião" que é iniciada por versos que remetem à uma moda de viola e em seguida ganha um naipe de sopros e se torna um mix de orquestra de pífaros com Easy listening (estilo de música orquestrada, que se tornou popular na década de 50, se tratando de temas instrumentais); tudo isso em uma harmonia quebrada e empolgante. Não soa como aquela canção que um bom ouvido treinado consegue imaginar o que está por vir, realmente é surpreendente.

A segunda canção, que da nome ao álbum, é uma composição de Rodger e Belchior. Trata-se de uma canção com todas as características do cancioneiro nordestino, aquela calmaria em forma de canção, com uma letra que cita o "conhecer o nordeste", contando com trechos em que se ouve um belo dueto do casal.

Na canção "A Risada do Diabo", se ouve, em especial, aquela maravilhosa sonoridade do triângulo que invade a alma e meio que sem perceber, quando se vê, está pulsando em sincronia, perfeita, ao bater do coração.

Em "Beco da Noite", a canção é iniciada por um violão, que tem como companhia uma discreta percussão e a voz da cantora, até que comece a surgir como destaque um piano rhodes de fundo, seguido por um solo de guitarra altamente blues, logo substituído por um naipe de metais; Tornando assim um tema com uma pegada mais instrumental do que as demais.

"Rodoviária" é uma canção que tem um começo melancólico, uma letra com ar de que ao longo da canção se estenderá dessa maneira, mas do nada... Ganha um vigor em uma levada inusitada, em que a voz de Rodger caiu como uma luva e mostra mais uma vez a versatilidade e o ímpeto de surpreender o ouvinte. Os mais impacientes, daquele tipo que nos primeiros segundos determina se a canção o agradaria ou não, certamente perderiam a maravilha harmônica que se esconde nessa música.

"Fox-Lore" como o nome já sugere, seria digna de ser tocada por qualquer Big Band em um baile foxtrot, isso se em mais uma investida daquelas que surpreende qualquer mortal, a orquestra não fosse silenciada pela doce voz de Teti, cantando um trecho da canção infantil "Carneirinho, Carneirão". Que porra é essa? De onde surgiu a ideia? Não sei! Mas não é que ficou interessante... Já que encontraram uma maneira de ao fim do trecho a big band já entrar com tudo novamente e a canção assim segue.

Bem! O álbum é muito interessante. Se já não bastasse tudo o que foi citado, ainda há a canção "Coroação" que é um agradável sambinha, "Retrato Marrom" que pasme, é um tango; e mais, bem mais, que só mesmo ouvindo o álbum e vendo o quão genial é a mente nordestina.

Acho uma verdadeira prova de burrice, lembrar do nordeste apenas por conta das secas que dizimam gado e plantações, a terra rachada e o sol escaldante; o nordeste é de uma riqueza que fica evidente quando se fala em Ariano Suassuna, Jackson do Pandeiro, Luiz Gonzaga e tantos e tantos outros gênios oriundos daquela "Chão Sagrado.

O sertão nordestino é lindo, profícuo de arte, de gente receptiva, de paisagens maravilhosas, mesmo em meio a todas as dificuldades existentes. Não relato o que li em livros ou vi na televisão, eu fui ao sertão e esteja, certos, trouxe na bagagem incontáveis maravilhas, daquelas que se escolhe carregar por toda a vida...

Músicas:

Lado A 01 -- Bye-Bye Baião -- Rodger Rogério e Dedé (00:00) 02 -- Chão Sagrado -- Rodger Rogério e Belchior (03:32) 03 -- Risada do Diabo -- Petrúcio Maia (06:37) 04 -- Beco da Noite -- Pepe e Rodger Rogério (08:21) 05 -- Rodoviária -- Rodger Rogério e Brandão (12:09) 06 -- Fino Fio -- Rodger Rogério (15:08) Lado B 01 -- Fox-Lore -- Rodger Rogério e Dedé (18:19) 02 -- Siá Mariquinha -- Luiz Assunção e Evenor Pontes (21:22) 03 -- Coroação -- Rodger Rogério (23:20) 04 -- Retrato Marrom -- Rodger Rogério e Fausto Nilo (26:02) 05 -- O Lago -- Rodger Rogério e Fausto Nilo (27:56) 06 -- Amália -- Rodger Rogério e Fausto Nilo (29:17)


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